A música caipira tem sua origem no dia-a-dia do povo simples do interior brasileiro. Cresceu e desenvolveu-se rodeada por histórias de pescarias, caçadas, transportes de boiada, na fé de nossos ancestrais, nos amores e romances proibidos, ou não, nas prosas de final de tarde nos terreiros, na sabedoria de um povo que observava a natureza, que apreciava uma boa cachaça e um bom fumo de corda.
Voltando um pouco no tempo e analisando a história da colonização brasileira podemos destacar, segundo Romildo Sant’Anna (autor do livro “A moda é Viola”), três pilares que serviram de alicerce para a construção da nossa música caipira, são eles: portugueses, índios e africanos. Os portugueses foram os responsáveis pela introdução da viola no Brasil, os índios contribuíram com a dança (batiam pés e mãos – o que mais tarde deu origem a Catira) e os africanos trouxeram boa dose de musicalidade e ritmo ao caldeirão caipira.
Com o passar do tempo e a chegada de outros imigrantes ao Brasil, o caldo caipira foi engrossando, principalmente pelos italianos e espanhóis que vinham para trabalhar nas lavouras e logo se misturavam aos caipiras brasileiros. Tonico e Tinoco, por exemplo, umas das duplas mais famosas do Brasil são filhos de espanhol. Mário Zan, compositor da música Chalana (símbolo do Pantanal), é italiano de nascimento, chegou ao Brasil com 4 anos de idade.
O resultado de toda essa mistura de raças e costumes trouxe para a música caipira um fundo nostálgico, introduzido, principalmente, pelos imigrantes que se encontravam longe de suas famílias. Renato Andrade, violeiro de Abaeté, define muito bem a essência da música caipira ao afirmar que “moda bem tocada é aquela que desperta em nós uma saudade que a gente nem sabe do que”.
Como trabalhavam duro na roça e não tinham oportunidade para estudar, muitos dos grandes mestres da música caipira mal sabiam escrever o próprio nome. Com isso a música caipira seguiu seu caminho apoiada nos causos que passavam de geração para geração, histórias que percorriam cidades e que muitas vezes se transformaram em letras maravilhosas que, até hoje, não sabemos se são verdadeiras ou não.
Ao longo de sua trajetória a música caipira se transformou em um símbolo de originalidade que, muitos afirmam, melhor expressa a história e a vida do povo brasileiro.
Bibliografia
Ribeiro, José Hamilton. Música Caipira: as 270 maiores modas de todos os tempos. São Paulo: Globo, 2006.
Final da década de 20, mais precisamente em 1929, o poeta, compositor, escritor e intérprete, chamado Cornélio Pires, natural da cidade de Tietê (SP), iniciou uma grande revolução no mercado da música caipira.
Cornélio bancou do próprio bolso a gravação do primeiro disco caipira da história da música brasileira. Era um disco de 78 rotações que apresentava a música Jorginho do Sertão interpretada pela dupla Caçula e Mariano (tio e pai do sanfoneiro Caçulinha, respectivamente). O que parecia loucura, devido a música caipira ser de origem rural e repleta de erros de português, logo se tornou o estopim de uma grande explosão de vendas.
Jorginho do Sertão, primeira música caipira a ser gravada, possui composição leve e irreverente.
“O Jorginho do Sertão
Rapazinho de talento
Numa carpa de café
Enjeitô treis casamento
Logo veio o seu patrão
Cheio de contentamento
(tenho treis filhas “sorteira que
Ofereço em casamento)
Logo veio a mais nova
Vestidinho cheio de fita
Jorginho case comigo
Que das treis Sô a mais bonita
Logo veio a do meio
Vestidinho cor de prata
Jorginho case comigo
Ou então você me mata
Logo veio a mais véia
Por ser mais interesseira
Jorginho case comigo
Sou a mais trabaiadeira
Jorginho pegou o cavalo
Ensilhô na mesma hora
Foi dizê pra morenada
Adeus que eu já vou me embora
Na hora da despedida,
Ai, ai, ai
É que a morenada chora
Ai, ai, ai
O Jorginho arresorveu
É melhor que eu mesmo suma
Não posso casá cum as treis, ai
Eu num caso cum nenhuma”
Para divulgar o primeiro disco, Cornélio Pires concentrou suas energias na venda de vitrolas. O raciocínio era simples, sem vitrola não tinha como ouvir o disco. Numa ação comercial arrojada, presenteava o comprador da vitrola com um disco de música caipira. Ao mesmo tempo organizou um grupo de artistas chamado “Os caipiras de Cornélio” e saiu em caravana pelo interior fazendo apresentações em circos, vendendo vitrolas e distribuindo seu disco caipira.
A turma caipira de Cornélio Pires. Foto histórica de 1929, da esquerda para a direita, em pé: Ferrinho, Sebastião Ortiz de Camargo (Sebastiãozinho), Caçula, Arlindo Santana; sentados: Mariano, Cornélio Pires e Zico Dias.
Em pouco tempo as mil cópias da primeira edição do disco se esgotaram e Cornélio partiu para a impressão da segunda edição e abriu, definitivamente, a porteira do sucesso para a música caipira. Diga-se de passagem, mil cópias era um número expressivo para a época, as edições de discos geralmente saiam com 400 discos!
Homem de visão comercial privilegiada, Cornélio foi então contratado pela gravadora como produtor de discos de música caipira. Para garantir preços acessíveis ao povo, adotou a inserção de anúncios de patrocínio nas capas dos discos. A estratégia de preços baixos, junto ao crescimento e audiência dos programas caipiras nas rádios, impulsionou a venda de discos.
Cornélio faleceu em 17 de fevereiro de 1958 aos 73 anos. Seu espírito inovador e desbravador deixou uma contribuição inquestionável para o início da comercialização e divulgação da música caipira brasileira.
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Bibliografia
Ribeiro, José Hamilton. Música Caipira: as 270 maiores modas de todos os tempos. São Paulo: Globo, 2006.
Internet
http://pt.wikipedia.org/wiki/Cornelio_Pires
O estado de São Paulo foi o grande berço da música caipira. Das terras paulistas nasceram cantores, violeiros e compositores que fizeram e contaram a história do Brasil caipira. Do litoral ao interior, passando pela capital do estado, a caipirada floresceu. A seguir apresento uma lista (que não é definitiva) das cidades e seus respectivos artistas.
Agudos: Palmeira
Araraquara: Cascatinha
Araras: Inhana
Barretos: Florêncio
Bofete: Carreirinho
Botucatu: Raul Torres, Serrinha
Cordeirópolis: João Pacífico
Guaratinguetá: Lourival dos Santos
Itajobi: Vieira e Vieirinha, Liu e Léu, Zico e Zeca
Itapetininga: Teddy Vieira
Itápolis: José Fortuna
Itaporanga: Angelino de Oliveira
Jaú: Marrueiro
Mogi das Cruzes: Anacleto Rosas Junior
Ourinhos: Mary Galvão
Palmital: Marilene Galvão
Paraguaçu Paulista: Nhô Pai
Penápolis: Sulino
Pratânia: Tinoco
Santa Cruz do Rio Pardo: Zilo e Zalo
Santos: Renato Teixeira
São Carlos: Pardinho
São Joaquim da Barra: Rolando Boldrin
São Luiz do Paraitinga: Elpídio dos Santos
São Manuel: Tonico
São Paulo: Inezita Barroso, Sérgio Reis
Tietê: Cornélio Pires, Ariovaldo Pires (Capitão Furtado)
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Bibliografia
Freire, Paulo. Eu Nasci Naquela Serra. São Paulo: Paulicéia, 1996.
Nepomuceno, Rosa. Música Caipira: da roça ao rodeio. São Paulo: Ed. 34, 1999.
Ribeiro, José Hamilton. Música Caipira: as 270 maiores modas de todos os tempos. São Paulo: Globo, 2006.
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